quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Voltando às cinzas

Ao longo dos anos a antiga TV/Rádio Piauí, hoje Sistema Antares (TV e rádio), sempre foi uma estatal com um objetivo claro e único: ser cabide de empregos à mercê dos políticos e suas conveniências. Sem estrutura, sem profissionais concursados (ainda continua assim), eram raros os programas que faziam o papel social destinados às TVs e às rádios estatais: oferecer programas informativos, culturais e educativos de qualidade para a sociedade. Nos últimos anos, mais precisamente no governo Wellington Dias, essa triste história começaria a mudar. Pelo menos era o que parecia. Foram feitos investimentos talvez nunca imaginados na instituição. Muito se deve ao empenho e à coragem do diretor da instituição, Rodrigo Ferraz, que, aliás é jornalista, e ao próprio ex-governador Wellington Dias que decidiu valorizar as idéias de Rodrigo. Pouco a pouco a Antares foi crescendo, se reorganizando, nascendo das cinzas, como uma Fénix. Hoje tem uma estrutura que faz bonito diante das emissoras privadas do Piauí. Abriu um canal em Picos e outro em Parnaíba com estruturas próprias (entre as privadas, somente a Globo possui uma filial no interior do Piauí – em Floriano). Contratou profissionais competentes e pagava bem, muitas vezes melhor que as privadas (que, aliás, quase sempre pagam uma ninharia), implantou programas interessantes, inteligentes, diversificados, um jornalismo de qualidade. Começava a despertar o interesse na sociedade. Brigar pela audiência não é papel de veículos estatais. As emissoras privadas brigam pela audiência e fazem muitas ações questionáveis por isso. Precisam da audiência para aumentar a publicidade e com isso aumentar a arrecadação. Os veículos estatais são pagos com recursos públicos. O papel deles é outro. E a Antares começou a fazer isso. Graças aos investimentos e, principalmente, aos profissionais que atuam nela. Mas, na contra mão de tudo isso, o governador Wilson Martins em menos seis meses de governo já atingiu por duas vezes o coração da instituição. Antes da eleição determinou o corte de pessoal e de salários. Ontem, dez dias depois da eleição, fez nova determinação cortando novamente o repasse em 40%. O clima de desrespeito e humilhação tomou conta de todos os que fazem o Sistema Antares e que tiveram os salários novamente cortados e, numa atitude típica de Poliana, ainda davam graças a Deus por não terem sido demitidos (a primeira informação do dia falava em demissão). Para completar, o secretário de Administração do Estado, Evaldo Ciríaco, foi “explicar” o que estava acontecendo e disse que o governo não mandou demitir ninguém. Só cortou o repasse (você entendeu?). Segundo Ciríaco, a Coopcom (cooperativa que contratou todos os profissionais) é que deve decidir se demite ou não. Ciríaco pode até não tido a intenção, mas a explicação dele ficou parecendo uma ironia, um deboche. Hipocrisias como essa só vão deixar de acontecer quando o Governo do Estado finalmente decidir fazer concurso público para a TV e para a Rádio Antares. Aliás, é isso que a determina a Constituição. Ontem, alegando crise financeira, o governador Wilson Martins tomou uma atitude desrespeitosa e humilhante para os profissionais que fazem o Sistema Antares, para as famílias deles, para a instituição e para a sociedade. Ele tem mais quatro anos de governo e ainda tem uma chance de mostrar que pensa diferente e que pode agir diferente. Wilson pode valorizar a Antares e o Estado e fazer o concurso público, eternizando a valorização da instituição (e de quebra ainda fazer valer a Constituição Federal) ou pode simplesmente ir na contramão da história e “esquecer” a Antares num canto, capengando e agonizando. Wilson é o governador, ele decide. Só precisa lembrar que as conseqüências dessas decisões ficarão na história.

(Publicado originalmente na coluna Roda Viva - Jornal O Dia, do dia 11 de novembro de 2010)

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Quando a politicagem vence a oportunidade

O rumo dessa associação católica-evangélica-eleitoral sobre aborto é impressionantemente ridícula. Mostra como somos despreparados, e a política, suja. Perde-se uma grande oportunidade de discutir um tema polêmico, sem dúvidas, mas que já passou da hora de ser debatido com mais profundidade e por toda a sociedade, incluindo as igrejas, que se mantêm irredutíveis em seus dogmas e/ou visões de mundo, apesar de todos os anos milhares de mulheres morrerem em clínicas clandestinas vítimas de ações mal feitas em locais despreparados por gente aproveitadora. Um estudo realizado pelo Ipas Brasil e o Instituto de Medicina Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, com apoio do Ministério da Saúde, revelou que o número de abortos realizados no Brasil passa de 1 milhão por ano. Mais de 220 mil deles têm como conseqüência, entre várias complicações, infecções graves e perfurações no útero. Evitar discutir o tema é ignorar esses números, é fechar os olhos para a realidade que temos em nossa frente. Com o tema transformado em politicagem por interesse puramente eleitoreiro perde-se a oportunidade de tratar essa questão como problema de Estado, que precisa ser revisto. Prefere-se continuar negligenciando, fingindo que o aborto não existe, que as mulheres não estão morrendo, que o número de crianças com deficiência vítimas de tentativas de aborto mal sucedidas não está aumentando. A pergunta é: ser simplesmente contra e cruzar os braços resolve alguma coisa? E tem outra: você realmente acredita que alguém deixará de abortar simplesmente porque não tem a estrutura do Estado para atendê-la ou porque a igreja, seja qual for, é contra? Quem quer abortar o fará, independentemente de qualquer coisa, independente da igreja dizer que é feio ou sujo ou pecado ou que a pessoa vai arder no inferno. A diferença é que o Estado, ao tratar do tema, pode construir uma política pública voltada para esta questão, de forma responsável, debatida, tratada com seriedade e transparência. Querer evitar tratar de um assunto como o aborto é uma hipocrisia sem tamanho. Cair nessa armadilha é reduzir a nossa capacidade de inteligência e ao mesmo tempo valorizar ações políticas nojentas. Manipular esse debate como uma arma político-eleitoreira chega a ser inescrupuloso.

(Publicado originalmente na coluna Roda Viva, Jornal O Dia - 14.09.10)

quarta-feira, 3 de março de 2010

Pensa que é fácil?

Mantenha um diálogo antes das 7 horas da manhã, quando seu cérebro ainda está tentando pegar no tranco, com uma criança de 4 anos e tenha perturbações eternas.
Ainda estou transtornado com a pergunta de hoje, com a minha ignorância, minha incapacidade de argumentação e de diálogo maduro.
Tudo bem que nos primeiros minutos do dia eu não funciono direito. Meu corpo e minha mente demoram a sair do estado letárgico da noite e minha concentração dá para mal para tentar sobreviver ao trânsito maluco que leva às escolas. E foi assim que veio o choque:

-    Papai, por que na boca tem um céu?


Ainda estou pensando na resposta que darei a Felipe.

segunda-feira, 1 de março de 2010

Felipe, após ir para o banco de trás do carro e colocar o cinto de segurança...

- Eu estou de parabéns?

Amor é síntese

Por favor, não me analise
Não fique procurando cada ponto fraco meu.

Se ninguém resiste a uma análise profunda,
Quanto mais eu
Ciumento, exigente, inseguro, carente
Todo cheio de marcas que a vida deixou
Vejo em cada grito de exigência
Um pedido de carência, um pedido de amor.

Amor é síntese
É uma integração de dados
Não há que tirar nem pôr
Não me corte em fatias
Ninguém consegue abraçar um pedaço
Me envolva todo em seus braços
E eu serei o perfeito amor.


(Mario Quintana)

P.S.Assim comecei a descubrir que parte de mim havia sido traduzida pelas palavras de Quintana.

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Poderes mágicos

Felipe sabe como provar que tudo na vida é muito simples de se resolver.
Com ele o “querer é poder” é muito mais que um simples clichê. A dificuldade é a gente que faz. Ele não.
Foi assim quando decidiu, por exemplo, que vai ter a idade do Ben10. E já no seu próximo aniversário, dia 21 de abril, quando deveria fazer apenas 5 anos.
Quer ficar forte como o personagem de animação norte-americano, que é febre entre as crianças, para enfrentar os bandidos e os monstros do mal.
Ben10 deve ser a palavra que ele mais pronuncia durante o dia. E olha que é difícil escutar o silêncio com Felipe por perto.
Poderes mágicos Felipe já tem. Foi muita sorte, mas ele disse que conseguiu recuperá-los.
Não sabe explicar o que houve exatamente. Conta somente que todos os seus poderes haviam sido perdidos na última vez que fomos para Barra Grande.
Não sabe dizer se havia criptonita por perto. “O que é criptonita?”, me perguntou, curioso. Também pudera, criptonita faz parte das histórias do Super-Homem, uma animação do tempo da minha infância.
O fato é que ele lembrava apenas de ter colocado as duas mãos no mar e então seus poderes foram sugados e apropriados por um tubarão que passava nas proximidades.
Peixe cartilaginoso de sorte aquele. Com tantos poderes virou o rei do mar.
Sempre achei Barra Grande cheia de mistérios. Porém, confesso, nunca imaginei que chegasse a tanto. Roubar os poderes mágicos de uma criança é um absurdo. Um crime imperdoável.
Passei algum tempo sem conseguir visualizar aquela praia belíssima com suas curvas e cores que me fascinavam desde criança. Não era mais do mesmo jeito. Tinha sempre um pouco de rancor, uma mágoa.
O encanto do lugar só voltou a predominar em minhas lembranças quando Felipe recuperou a sua mágica, misteriosamente.
Pela versão oficial, um dia ele acordou e estava com os poderes de volta. A inexplicável recuperação até que se justifica já que a perda dos tais poderes também foi sem explicação. Concluí com isso que a culpa não estava na praia de Barra Grande, ainda que não haja um esclarecimento racional para os dois fenômenos. Menos mal. Barra Grande voltou a ser doce como em minhas memórias de sempre. E o final, em construção, voltou a ser feliz.
Bom, voltando à questão da idade do tal Ben10. Felipe descobriu que seu super-herói preferido tinha 10 anos e não teve dúvidas: ia comemorar a mesma idade no seu próximo aniversário.
Seria um envelhecimento muito precoce, uma queima grande de etapas. Cinco anos e tudo o que eles oferecem jogados ao léu, sem o devido aproveitamento. Hipnotizado pela ignorância própria dos adultos podados tentei explicar que isso não seria possível. Formulei uma construção didática que, ao meu modo cego de enxergar, seria infalível:

-    Quantos anos você tem?
-    Quatro
-    E depois do quadro vem o quê?
-    Cinco
-    Então. Infelizmente não tem como fazer dez anos agora no seu próximo aniversário. Ainda vai demorar um pouco.
-    Já sei como fazer, papai.
-    Sabe?
-    No lugar da vela de cinco eu coloco uma de dez anos. A gente canta os parabéns, eu sopro e então vou ter 10 anos e ser forte como o Ben10.

Depois dessa, a única coisa que pensei foi na tristeza daquele tubarão que teve a sorte de experimentar e, sem ter culpa alguma, pouco tempo depois perdeu os poderes mágicos de Felipe.


quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Liberdade na vida é ter um amor para se prender.
(Fabrício Carpinejar)

Triscaidecafobia

Você sabe o que é triscaidecafobia?
Medo do 13.
Agora imagine um petista que acabou de conhecer essa palavra e quis incluir sua bagagem cultural numa discussão com um tucano:
- Suas críticas não têm razão de ser, você só as faz porque é um triscaidecafóbico. 
- Você me respeite. Eu respeito todo mundo, todas as crenças, todos os partidos, todas as opções sexuais. Mas isso eu não admito.
- T-R-I-S-C-A-I-D-E-C-A-F-Ó-B-I-C-O
Somente três dias depois, quando saiu do coma no hospital, o petista entendeu que a "força das palavras" pode ser bem mais que uma expressão.

O buraco é mais embaixo

A polêmica sugestão do vereador Edson Melo (PSDB) foi atendida. Sem aviso prévio a Prefeitura de Teresina resolveu abrir o trânsito na rua Senador Teodoro Pacheco, que passa em frente ao Theatro 4 de Setembro. A nova rua funcionará apenas durante o dia, de 6h às 18h. À noite, será fechada.

A prefeitura diz que atendeu um pedido dos lojistas e que será por um período de apenas dois meses, mas vai danificar um dos poucos locais aprazíveis do Centro de Teresina.

Ah, sim, a rua também faz parte do Complexo Cultural e é tombada pelo Patrimônio Histórico Estadual.

A medida argumentada como paliativa é na verdade uma prova da incapacidade ou falta de coragem de organizar de fato o trânsito de Teresina.

E o pior, não vai resolver absolutamente nada.

O problema no trânsito do Centro não é de agora, por conta das obras da Agespisa. Ele existe desde muito tempo atrás.

Assim como existe na Avenida Frei Serafim, na Coelho de Resende, na Desembargador Pires de Castro, na Higino Cunha, e na Miguel Rosa, só para especificar alguns casos.

Qualquer pessoa que conheça minimamente Teresina sabe identificar os pontos críticos e até se arriscaria a apontar soluções (imagina quem estudou pra isso).

Tem até vias para o trânsito dos veículos, mas elas são obstruídas por estacionamentos (regulares e irregulares), assim como falta fiscalização, falta educação no trânsito, falta orientação, falta a presença dos azuizinhos nos locais eternamente críticos, falta um estudo de engenharia de trânsito e falta força de vontade de encarar o problema de frente.

Enquanto a STRANS e a Prefeitura não pararem de enxergar medidas paliativas, não entenderem que a capital do Piauí não é mais uma cidade do interior, uma casa de comadres, nada será resolvido de fato.

Uma coisa é certa: definitivamente abrir cem metros de rua não resolverá o problema de organização no trânsito no Centro de Teresina.

Bem melhor seria abrir a cabeça dos gestores que tiverem essa idéia de jerico.

(Publicado na coluna Roda Viva de quinta, dia 14 de janeiro de 2010)

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Não consegui sair nem da fase experimental e muito menos chegar perto da proposta que idealizei e já cai na armadilha de quem tem blog: deixar de atualizá-lo. Perdão pela fraqueza. Tentarei resistir a essa tentação em 2010. Deus me dê força e coragem.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

A regra é clara, ou não

Diferente do Brasileirão, no jogo do amor não há campeão
Ou você concorda com o empate
Ou os dois são derrotados
E voltam para a segunda divisão

A rua não estava lá

Frases de Felipe – 4 anos

O palco é a praça de alimentação da Praia de Verão do Teresina Shopping. Após tomar um copo de coca-cola, Felipe dá um arroto daqueles, digno de deixar qualquer pai do tipo babaca-machão (quem não fica assim durante 5 minutos por dia que atire a primeira pedra) gargalhando todo orgulhoso. Repreendido por quem tem um pouco mais de noção de civilidade e de convivência social, mudo a face e uso meu ar de pai austero para dar noções básicas de educação convencional:  

-    Felipe, a gente não pode arrotar desse jeito quando estiver na rua?

Instantaneamente ele olha pra um lado e pro outro, ativa as dobras dos cotovelos pra baixo e as palmas das mãos pra cima e se defende com a prova cabal de quem está totalmente certo:

- E cadê a rua papai?

Moral da história: O preço de ser babaca-machão é bater com a cara no chão.